quarta-feira, 6 de julho de 2011

Pelo direito de ficar triste

Em meio a ansiedade (boa) que tenho vivenciado e a tantas coisas que tenho pensado sobre a minha vida (que trazem uma angústia natural) tenho ouvido muito "por que você não toma um remédio?" "Tome um antidepressivo".

E escuto esse conselho ser dado pra muita gente. Nos locais onde trabalho grande parte das pessoas usa algum tipo de medicação de ação no sistema nervoso central. Vira e mexe alguém vem me pedir pra dar/trocar uma receita.

Sim, depressão realmente existe. É uma doença séria e precisa ser tratada. Mas existe também tristeza, angustia, alegria, cansaço... sentimentos normais.

Parece entretanto que atualmente todo mundo tem obrigação de ser feliz, bem disposto, engraçado. Não se enquadra nisso? Tome esse remedinho que você ficará "bem".

Mas como aproveitar de verdade a vida, como ter metas, planos, sonhar com um cérebro modulado por medicação?

Cada vez mais cedo se diagnosticam patologias pra sentimentos e comportamentos normais. Na infância a moda é ser hiperativo. Fez mal criação, não quer estudar, se distrai com facilidade? É hiperativo! E tome ritalina, que é uma anfetamina mas que vem sendo dada como se fosse um chá de erva doce, sem preocupação alguma com efeitos colaterais.

Na adolescência depressão, transtorno de comportamento, e tome sertralina, fluoxetina, risperidona! E vamos controlar todas as emoções da fase mais cheia de emoções com medicação! E vamos construir uma personalidade sob efeito de remédios!

Depois de adulto as coisas pioram. Sei que minha amostra é viciada pois nos serviços de saúde o acesso a medicação é mais fácil. Ir ao psiquiatra? Não, peço pro meu colega me passar alguma coisinha, ou pego a receita de um amigo e peço pro meu colega repetir.

Mas mesmo fora desse universo de trabalhadores da saúde o uso de medicação é amplo e crescente.

Eu já tomei antidepressivo em uma época em que as coisas estavam realmente ruins. Emocionalmente ruins. E a mudança foi estrondosa. Em uma semana eu era outra. Nada mais me incomodava. A vida era bela.

Era mesmo? Não, eu estava dopada. E isso com uma medicação considerada leve, em dose baixa. Eu passei a ser muito mais alegre e tolerante. Inclusive com o que não se deve tolerar. A vida é uma só, devemos aceitar tudo e seguir conformados às custas de remédios que alteram nossos sentimentos e comportamentos?

E justamente por isso que eu não quero de jeito nenhum tomar remédio agora. Porque se eu estou vivendo uma fase de questionamento, de tentar me entender como posso optar por tomar uma substância que vai alterar completamente minhas emoções?

Então é isso... menos remédio, mais emoções. Porque ficar triste quando tudo tá uma merda é normal, ficar angustiado diante de uma decisão é normal, enfim é natural reagir a acontecimentos.

Medicar quando necessário é importante, algumas vezes as coisas realmente saem do controle e sem remédio não se consegue reagir a nada. Mas antes disso deveriam vir música, livros, passeios, conversa jogada fora. Ser ou estar feliz de verdade e com coisas reais.

PS: esse post nasceu porque em um mesmo dia um amigo postou no facebook algo sobre uso desnecessário de rivotril, eu ouvi de novo que deveria tomar algum remédio, dois colegas de trabalho me pediram receita de antidepressivo e discuti com algumas amigas o uso abusivo de ritalina e o hiperdiagnóstico de transtorno de deficit de atenção e hiperatividade.

sábado, 2 de julho de 2011

"Sem a música, a vida seria um erro"*

* Friedrich Nietzsche

Eu não sou música, não toco instrumentos, não canto. O mais próximo disso que cheguei foi estudar um pouco de piano quando adolescente. Infelizmente, ou felizmente, minha relação com a música fica em outro plano. E tenho que dizer que esse plano é um plano superior, quase sagrado.

Minha primeira recordação afetiva relacionada a música é estar sentada no chão aos 4 ou 5 anos ouvindo Stairway to Heaven tocada no violão de meu pai. E que recordação doce! Led Zeppelin entrou cedo na minha vida pra nunca mais sair. Tive essa sorte de tão cedo conhecer uma das maiores bandas do mundo.

Entretanto foi na adolescência que a música começou a ter uma real importância na minha vida. Foi aí que comecei a encontrar nela acalento e resposta pra minhas angústias.

"Quero um machado pra quebrar o gelo, quero acordar do sonho agora mesmo, quero uma chance de tentar viver sem dor" me dizia Thedy aos 12 e eu me fortalecia pra lidar com os novos sentimentos que bagunçavam a minha cabeça. Renato dizia " Sou uma gota d'água,sou um grão de areia, vc me diz que seus pais não lhe entendem, mas vc não entende seus pais" e era tão verdade.

E então a primeira grande banda entrou na minha vida: Guns and Roses. Eu com 13/14 anos me apaixonei (de verdade!) pelo Axl Rose e passei a devorar tudo que tivesse relação com eles. E muitos posteres, muitos recortes de jornal, muita revista Bizz. Estávamos em uma era pré internet e nos primórdios da MTV no Brasil. Quantos clipes eu assisti suspirando!

O Guns trouxe pra mim além de uma paixão, o interesse pelas letras em inglês, e isso tem uma importância gigantesca no rumo das coisas a partir daí. Eu, que até então tinha dificuldade no inglês fraco do ensino fundamental (ginásio!), passei a ter facilidade em entender o idioma. Tanto por decorar e traduzir as letras como por ler as revistas importadas que eu as vezes conseguia comprar. Acho que não seria exagero afirmar que o inglês que eu sei hoje (que confesso não ser perfeito, mas que dá pra se virar) me foi dado pela música!

E foi com Guns que eu tive a primeira experiência em ver um ídolo tocando ao vivo. E como foi incrível! Assistir a um show pra quem tem um apego musical como eu tenho é uma vivência única. Uma liberação pro espírito, uma elevação da alma. Tenho uma lembrança clara desse dia inteiro, do show e da euforia depois dele, caminhando pro estacionamento no meio da multidão, falando sem parar, emocionada.

Nessa época entrou na minha vida o Pearl Jam. Me encantei imediatamente pelas músicas e pelas letras de Eddie Vedder. E não foi uma paixão, foi um encantamento real. Dessa vez eu não queria me casar com Eddie, eu só queria ouvir o que ele tinha a dizer. E como ele tem coisas a dizer. E como eles diz coisas como ninguém!

Seattle passou a ser referência pra mim. Não só Pearl Jam, mas Soundgarden, Alice in Chains, Nirvana... e fora de lá Blind Melon.

"Even flow, thoughts arrive like butterflies, Oh he don't know, so he chases them away, someday yet, he'll begin his life again"

"Head at your feet, fool to your crown, fist of my plate, swallowed it down, enmity gauged, united by fear, tried to endure, what I could not forgive"

E aí eu já estava totalmente envolvida. Coisa de adolescente? Poderia parecer, mas não era. Cá estou com mais de 30 e ainda absorta.

Quando tudo está bem eu escuto música como todo mundo. No rádio, de vários estilos. Mas quando as coisas não estão fáceis escuto repetidas vezes a mesma música. Perdi as contas dos conselhos que "recebi" de Eddie Vedder. Das vezes que fui consolada por ele. Do quanto ele me inspirou. Além dele me socorrem Thom Yorke que, ainda que muitos digam que faz músicas que dão vontade de se matar, escreve coisas maravilhosas e Shannon Hoon que partiu tão cedo mas deixou coisas tão profundas e sábias escritas que passados mais de 15 anos ainda recorro a ele em momentos de desespero emocional.

Gosto e gostei de muitas outras bandas como Coldplay, Oasis e Aerosmith por exemplo que ouço sem compromisso, sem nada além de diversão e distração. E isso também é ótimo, tive a oportunidade de ver essas bandas ao vivo e foram shows incríveis, momentos de êxtase. Entretenimento puro.

Em 2005 depois de cerca de 13 anos de espera tive a oportunidade de ver ao vivo a maior banda do mundo. Poucas pessoas entendem o significado disso na minha vida. Poucas pessoas entendem o porque de eu ter me mobilizado pra ver o maior número possível de shows. "Shows iguais?" "Gastar dinheiro viajando pra ver uma banda que tocará DUAS vezes aqui em São Paulo?"

Foram 6 dias intensos, emocionantes e inesquecíveis. 3 vôos, 4 shows, e um vulcão de sentimentos. Passados quase 6 anos a lembrança dessa semana ainda me dá frio na barriga e vontade de chorar de emoção.

Eu gostaria de ser capaz de descrever a experiência de ver diante de mim Eddie Vedder, Stone Gossard, Jeff Ament, Mike McCready e Matt Cameron. Mas não sou. Nem que eu passe horas ou dias tentando. Então vou apenas dizer que naqueles momentos era como se o resto do mundo não existisse, como se na minha cabeça não houvesse mais nada a não ser o que estava acontecendo naquele instante.

Em 2009 Radiohead veio pela primeira vez ao Brasil. E novamente me vi diante de um idolo mór. Não foi a mesma coisa que com o Pearl Jam. Mas foi transcendental, emocionante, maravilhoso. Thom Yorke diante de nós, com toda sua inteligência, com todo seu talento... levei cerca de 3 horas pra conseguir chegar em casa depois do show, mas eu estava tão enebriada pelo efeito dele que nada mais importava.

Desde 2005 espero a prometida volta do Pearl Jam ao Brasil. "Dois ou três anos, talvez um" me disse Eddie Vedder durante um dos shows. Mas lá se vão quase 6 anos. Nesse tempo eu vivi bem com a espera. Continuei ouvindo as músicas como mantras... e tudo ia bem até o começo desse ano.

Surgiu então uma necessidade enorme de vê-los novamente. Até sei o porque, mas fato é que isso coincidiu com uma enxurrada de boatos sobre uma nova vinda ao Brasil. A cada novo boato uma nova ansiedade. Datas e locais sempre de fontes duvidosas divulgados a todo momento. Por sorte não estou sozinha. Ganhei de presente em 2005 amigos que compartilham da mesma paixão que eu e que tem sido minha salvação esses dias. E se pra todo o resto da humanidade pode soar ridículo se angustiar por um possível show, pra eles (e pra mim é claro) isso é normal. Surto coletivo é muito melhor! Principalmente quando seus companheiros de surto são pessoas que você admira muito em tantos outros aspectos além do bom gosto musical.

E sigo aguardando um provável anuncio de show ouvindo todo dia a voz que me acompanha há quase 20 anos. E outras vozes que me acompanham há mais ou menos tempo, mas que são parte de minha vida tanto quanto meus amigos e minha família. Que muitas vezes souberam como ninguém me mostrar caminhos, soluções, que me deram e me dão força quando eu preciso, me distraem, me divertem. Sem ligar muito pro que outras pessoas possam achar disso. Se é loucura ou não pouco importa. Pra mim é natural e sendo assim é o que basta.